Leonardo Soares dos Santos
Pesquisador do IHBAJA e professor de História
Além
dos casos de corrupção e má-gestão nas repartições públicas, o regime militar
procurava monitorar nelas o que seus agentes chamavam de “focos subversivos”.
Nada escapava desse tipo de crivo: todo funcionário público era um “subversivo”
em potencial. E a Colônia Juliano Moreira não fugia a essa regra.
Mesmo
porque os militares identificaram desde a década de 60 a existência junto ao
Partido Comunista Brasileiro a existência de um “setor médico” vermelho. Tal
setor reuniria exatamente militantes (médicos, enfermeiros, nutricionistas, funcionários
administrativos) com atuação na área da saúde, principalmente do setor público.
Eles estariam espalhados pelos diversos departamentos e repartições que
compunham o sistema público de Saúde.
O Documento
de Informação nº 39 (22/05/73) do SNI exemplifica bem a grande preocupação dos
agentes da Ditadura. Nesse documento intitulado “Comunistas do Ministério da
Saúde atualmente na Divisão Nacional de Saúde Mental – DINSAM”, o autor do
relatório lista em poucas páginas os nomes e a trajetória dos principais nomes
de “agitadores subversivos” atuantes nesse setor. Ele vasculhava a presença de
comunistas nos vários órgãos subordinados à DINSAM como o Hospital Pinel, Centro
Psiquiátrico Pedro II e no Manicômio Judiciário Heitor Carrilho e a Colônia
Juliano Moreira.
Nesta
última o autor do relatório apontava um a um os principais comunistas. O primeiro
citado era Célio Assis do Carmo, acusado pelo autor de ter ligações com Washington
Loyello, este considerado um “psiquiatra comunista, inteligentíssimo,
doutrinador de algumas gerações [...], comunista dos mais importantes no Setor
dos Médicos do Partido na Guanabara”.
O segundo
nome era o de Raphael Quintanilha Júnior, médico da Colônia, “comprometido com
políticos esquerdistas do governo passado (leia-se: governo de João Goulart)”,
figurava nos arquivos do SNI como “membro do Conselho Deliberativo da Diretoria
anterior da Associação Medica do Estado da Guanabara”, era integrante da “chapa
comunista” desta entidade.
O terceiro
citado era Antonio Henrique Menezes, advogado, “encarregado de assuntos jurídicos”
da Colônia. Pesava contra Antonio as piores “acusações”: teria sido diretor de
um jornal sindical, onde em artigo publicado na edição de fevereiro de 1964, “manifestou
claramente, as suas ideias de desrespeito às autoridades do País, inclusive às
militares, concluindo assim o seu artigo ‘O BRIZOLA ESTÁ CERTO’”. Em 1967
respondeu a um Inquérito Policial Militar por ter instigado “a paralização do
Serviço Público, convidando os funcionários para a realização de greves” e por
ter feito “publicamente propaganda de ódio de classes, procurando indispor os funcionários
civis contra os militares”.
Outro
“delito” teria sido a participação em correntes e grupos políticos junto ao
movimento estudantil, como quando integrou a aliança entre a União Renovadora
(UR) e a Aliança Democrática Universitária (ADU) tendo em vista as eleições
para o Diretório Acadêmico Ruy Barbosa na Faculdade de Direito Cândido Mendes. Lembra
o agente que a UR foi a ala do PCB “dentro da Faculdade”.
Mas a
atitude que mais chamou a atenção do autor do relatório fora a tentativa de
Antonio de requerer uma certidão negativa de antecedentes políticos-sociais “para
fins de prova ao Ministério da Saúde”. O agente do SNI via nessa atitude mais um
ardil do comunista: “muito astucioso, tendo concluído que a Revolução de 64 não
permitiu a realização das suas ambições políticas, de parceria com Brizolas e
demais comuno-corruptos, pretende agora, anular as suas ações condenáveis,
antes da Revolução, e ainda por algum tempo depois da Revolução de 1964, até
quando a ‘Comunidade de Informações’ conseguiu tirar a sua ‘fotografia colorida’”.