No dia 03/12/2016 trabalhadores do Colégio Estadual Teófilo Moreira da Costa e moradores da comunidade remanescente Quilombola Cafundá Astrogilda organizaram uma visita-guiada pela trilha que leva até a comunidade, repleta de sítios históricos e com áreas represadas do rio Mucuíba que funcionam para banho e lazer. O local é bastante frequentado em dias ensolarados pelos moradores das Vargens e adjacências, sendo uma ótima alternativa à praia lotada durante o verão.
De acordo com a Fundação Cultural Palmares (FCP), instituição pública federal criada em 1988 voltada para promoção e preservação da arte e da cultura afro-brasileira, "quilombolas são descendentes de africanos escravizados que mantêm tradições culturais, de subsistência e religiosas ao longo dos séculos. E uma das funções da Fundação Cultural Palmares é formalizar a existência destas comunidades, assessorá-las juridicamente e desenvolver projetos, programas e políticas públicas de acesso à cidadania."
Em mais de 25 anos de atuação, a FCP identifica, reconhece e certifica comunidades quilombolas por todo o território nacional e já emitiu mais de 2.476 certificações para comunidades quilombolas. A certificação "reconhece os direitos das comunidades quilombolas e é referência na promoção, fomento e preservação das manifestações culturais negras e no apoio e difusão da Lei 10.639/03, que torna obrigatório o ensino da História da África e Afro-brasileira nas escolas."
Atualmente, na cidade do Rio de Janeiro são quatro as Comunidade Remanescentes de Quilombos certificadas pela Fundação Cultural Palmares: as duas mais conhecidas estão localizadas em áreas urbanizadas, ou seja, são quilombos urbanos: o da Pedra do Sal, na zona Portuária, e o Sacopã, na Lagoa, zona sul da cidade. As outras duas, menos conhecidas, estão situadas na zona oeste da cidade: são as comunidades Quilombola do Camorim, situada no mesmo bairro e a Cafundá Astrogilda, em Vargem Grande. Esta, certificada em 2014, foi a última comunidade quilombola da cidade do a ser reconhecida pelo Incra e pela Fundação Palmares.
Mapa das Comunidades Quilombolas do estado do RJ elaborado em 2013.
Fonte: RioOnWatch.org.br.
Localizadas, portanto, na região da Baixada de Jacarepaguá as duas comunidades remanescentes de quilombos possuem outra característica em comum: surgiram no entorno do Maciço da Pedra Branca. A Baixada de Jacarepaguá, durante o período colonial e de auge da produção açucareira no Brasil, chegou a abrigar onze (11) engenhos de fabricação do açúcar. Muitos são os registros fazendo referência à região como a "planície dos onze engenhos". Muitos, também, são os registros que fazem referência à presença quilombola e de resistência à escravização de negros africanos na região: a Serra do Quilombo (em Vargem Grande), a Pedra do Quilombo (na Taquara), a Serra dos Pretos Forros (entre a Covanca e Freguesia).
Nada fora do comum, dada a geografia da cidade do Rio de Janeiro, cortada por três grandes maciços, o do Gericinó/Mendanha, o da Tijuca e o da Pedra Branca, a existência de áreas elevadas, como morros e serras. Estes indícios da presença quilombola na região de Jacarepaguá são reforçados por inúmeras pesquisas que apontam a fuga para as "matas elevadas" e a organização de quilombos como uma das práticas principais de resistência à escravização na cidade do Rio de Janeiro. Daí a nomeação de morros, serras e outros elementos da geografia local fazendo referência ao passado quilombola da região de Jacarepaguá. Daí, também, explica-se, em parte, a existência das duas comunidades remanescentes de quilombo em Jacarepaguá terem se desenvolvido nas vertentes elevadas do Maciço da Pedra Branca.
Os três maciços da cidade do Rio de Janeiro.
Fonte: Aventritur.com.br
Vemos nesse mapa a área de abrangência do Maciço da Pedra Branca.
Fonte: Aventritur.com.br
E uma característica relevante de uma das comunidades remanescente de quilombos de Jacarepaguá é guardar até hoje em dia aspectos rurais: é o caso da comunidade quilombola Cafundá Astrogilda, em Vargem Grande. Muitas famílias que moram por lá ainda praticam agricultura de subsistência que contribui, também, para o abastecimento do mercado local de alimentos. Abóbora, aipim, inhame, banana, limão e diversas hortaliças são cultivadas por lavradores e lavradoras.
No local há mais de 200 anos, as famílias de moradores do quilombo Cafundá Astrogilda tem uma herança cultural de grande importância, não somente histórico-cultural mas, sobretudo, econômica, pois contribui para a produção de alimentos sem agrotóxicos para o consumo dos moradores da região de Vargem Grande. E a atividade realizada pelos trabalhadores do C. E. Teófilo Moreria da Costa tenta aproximar os estudantes moradores da região desta riquíssima experiência histórica e cultural, numa atividade lúdica e educativa.
Abaixo vemos alguns registros da atividade:
Os moradores do local Sandro e Alexandre relatam que neste ponto registrado pela foto funcionava um engenho de moer mandioca movido à água. Estrada do Mucuíba, Vargem Grande, via de acesso ao Quilombo Cafundá Astrogilda.
Estrada do Mucuíba, trecho que marca 100m de altitude do nível do mar.
Ainda de terra batida e cercada pela mata.
Flagrante do aspecto ainda rural da Comunidade Quilombola Cafundá Astrogilda: moradores usando cavalo como meio de transporte.
Um dos acessos à Comunidade.
Momento em que Jorge, morador-lavrador do quilombo Cafundá Astrogilda, fala aos estudantes sobre sua relação com a terra: "aqui praticamos a agricultura limpa."
Plantação de aipim e abóbora num sítio de lavrador do Quilombo Cafundá Astrogilda.
Texto e fotos: Renato Dória