Por Leonardo Soares dos Santos*
Por conta da II Guerra Mundial, as Copas de 1942 e 1946 foram suspensas.
O mais beneficiado com a conflagração acabou sendo o Brasil, que por
conta da quase aniquilação física e material da Europa foi instado por
Jules Rimet a sediar a Copa de 1949. Isso mesmo, a Copa se daria nesse ano e
não em 50. Mas, devido a atrasos nas obras(!), o governo pediu que o
evento fosse adiado em 1 ano. A FIFA prontamente acatou. Nem preciso
dizer que todo o processo de construção dos estádios foi marcado na
época por grandes denúncias de desvio, superfaturamento e atraso. Para
se ter uma idéia, nenhum estádio foi entregue pronto. E muita gente, mas
muita gente mesmo, reclamava pelo fato do governo gastar tanto num
“evento esportivo”, com escolas e hospitais caindo aos pedaços…..
(Careta, 1/11/47, p.16) O “povo antes de fazer ginástica precisa de
alimento”, tascava O Malho em sua edição de fevereiro de 1948.
Mas
nenhum estádio causou tanto rebuliço quanto o principal deles – o
Maracanã. Por muitas semanas muitos temeram que ele tivesse um outro
destino. E um personagem que tanto marcaria os destinos do país muito
lutou para que isso ocorresse.
Assim
que a Copa do Brasil foi confirmada, uma das primeiras providências foi
projetar um estádio para a então capital da república. Depois de
estudos sem qualquer transparência decidiu-se construí-lo no local do
antigo Jockey, também chamado de Derby Club, às margens do rio Maracanã.
Nascia então o projeto do Estádio Municipal – e esse era o seu nome. Só
faltava a famosa verba orçamentária, que em bom português brasileiro
significa – dinheiro arrancado do bolso dos contribuintes. Tudo corria
bem até o então prefeito Mendes de Morais levar tal demanda à Câmara
Municipal. Os governistas quiseram empurrar goela abaixo o projeto sem
maiores discussões. Mas para seu azar, um jovem vereador da UDN começava
ali sua trajetória, marcada pela virulência de seus discursos e
posicionamentos – integralmente anti-governistas e de direita. Estamos
falando de Carlos Lacerda. E uma de suas primeiras cruzadas foi lutar
contra o Maracanã.
Outros
eram mais radicais, como Tito Lívio, também da UDN, que era contra a
construção de qualquer estádio. Mas Lacerda não. A partir da constatação
dos absurdos gastos que se desenhavam, ele aproveitava para propor a
retomada do antigo projeto de construção de um estádio olímpico em
Jacarepaguá, de autoria do engenheiro Antonio Laviola. O estádio teria
capacidade para cerca de 150 mil pessoas, beirando a lagoa de mesmo
nome. O udenista via nisso a possibilidade de impulsionar a urbanização
da antiga zona agrícola. Até porque o projeto previa a construção de
loteamentos urbanos, uma estação de trem, uma Vila Olímpica. E de
quebra, o projeto de Laviola era muito mais em conta. Mas a proposta de
Lacerda foi muito mal recebida, Jacarepaguá ainda era vista como uma
roça, incompatível para receber um estádio moderno.
E
nisso se bateram os parlamentares defensores da localização no antigo
Derby. E ainda contaram com a entusiástica campanha de Mario Filho,
irmão de Nelson Rodrigues. Pelas páginas d’O Globo ele organizou um
verdadeiro movimento pró-Derby (Maracanã): o bombardeio contra Lacerda
era diário. Fato que contribuiu para que, décadas mais tarde, o estádio
recebesse oficialmente o nome de seu ardoroso defensor, como forma de
homenagem, embora popularmente sempre fosse chamado pelo nome do rio que
o margeava.
Mas
por alguns meses o homem que mais tramou golpes nesse país ameaçou
mudar o destino do “maior do mundo”. Se tivesse mais sorte, o estádio
tinha tudo para ser chamado popularmente de Jacarepaguá (nome da lagoa
que o margearia), e em termos oficiais seria o Estádio Municipal
Governador Carlos Lacerda. A História e seus ardis – já dizia o velho
Hegel.
* Leonardo Soares dos Santos é pesquisador do IHBAJA e UFF .