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domingo, 27 de agosto de 2017




Por Leonardo Soares, professor de História

Por boa parte do século XX Jacarepaguá fez parte da zona rural do Rio de Janeiro, região esta que foi por décadas chamada sugestivamente de Sertão Carioca: pois que “longe” (da área mais intensamente urbanizada), mas também chamada assim por possuir acentuado perfil agrícola.

Contudo, mesmo antes de ter seu processo de urbanização consolidado, o que se daria mais visivelmente na década de 80, o bairro de Jacarepaguá já era visto como um lugar razoavelmente estruturado, bem servido por meios de comunicação e serviços urbanos (luz, esgoto, telefone), comércio, acesso a praias (Barra e Recreio), mas que ao mesmo tempo ainda conservava significativa área verde, sítios, atividades agrícolas e uma interessante fauna. Ou seja, era como que a extensão da Floresta da Tijuca, mas que dosava bem os benefícios de uma vida rural com aspectos da vida urbana. E isso era um grande atrativo para uma certa classe média carioca. 

Exatamente por isso que desde os anos 30 a região tenha entrado na alça de mira de algumas personalidades famosas, que buscavam em Jacarepaguá sossego, uma vida mais tranquila, mas sem perder contato completo com o mundo urbano, a parte do Rio moderna e estruturada.

Um desses moradores ilustres foi Jacob do Bandolim (1918-1969), onde na sua imensa casa de Jacarepaguá costumava promover, sempre aos sábados, um delicioso sarau. Reunindo o que o samba tinha de melhor, figuras como Elton Medeiros, Clementina de Jesus, Paulinho da Viola e outros davam canjas lá. O que fazia da casa um verdadeiro Templo da música popular.



Jacob em sua casa de Jacarepaguá. Fonte: http://mobile.mis.rj.gov.br/blog/o-bau-de-jacob-do-bandolim/

Fonte: https://oglobo.globo.com/cultura/parte-do-acervo-de-jacob-do-bandolim-agora-digitalizada-vai-ser-doado-ao-mis-em-show-13843138

Jacarepaguá parecia ter um certo magnetismo com grandes nomes da música. Lá buscaram refúgio e sossego Cartola e sua companheira Dona Zica. Em 1978 eles sairiam da Mangueira após comprar uma casa na rua Edgar Werneck em Jacarepaguá em 1978.

  
 
Mestre Cartola e D. Zica em sua casa em Jacarepaguá.
Fonte: http://www.funarte.gov.br/brasilmemoriadasartes/acervo/pixinguinha/imagens/imagens-fotos/page/11/



Outro nome da música popular que aqui aportou foi Dalva de Oliveira. Bem antes de Cartola, na verdade. A cantora que imortalizou canções como Ave Maria do Morro e Bandeira Branca tinha uma linda casa em Jacarepaguá desde o início de 1950.


Fonte: https://www.facebook.com/umcoracaosuburbano/photos/pcb.802280316462601/802273856463247/?type=3&theater

Nos anos 70, além de Cartola, o bairro passou a abrigar mais uma estrela da música, e que também era muito identificada com a Mangueira: Antônio Carlos Bernardes Gomes, cantor dos “Originais do Samba” e que se tornou nacionalmente conhecido pelo apelido de Mussum, comediante dos Trapalhões. Mussum morou quase 20 anos em Jacarepaguá, no condomínio Eldorado. Onde morou também Dedé, Manfried Sant'Anna, seu parceiro no Quarteto trapalhão.
Mussum morou em Jacarepaguá até o seu falecimento em 1994. Era tão ligado ao bairro que chegou a fundar um bloco carnavalesco, o “Empurra que entra”. Dissolvido quando da sua morte e retomado em 2005. Cabe destacar o ex-prefeito Eduardo Paes homenageou o artista mangueirense e ilustre morador dando o nome de Largo do Mussum ao que antes se chamava Largo do Anil.

Fonte: http://veja.abril.com.br/entretenimento/globo-estuda-novo-trapalhoes-com-didi-dede-mussum-e-zacarias/


Só Zacarias não morou em Jacarepaguá. Pois Renato Aragão também chegou a ter uma casa de veraneio no mesmo condomínio Eldorado. Depois construiria uma mansão em outra parte de Jacarepaguá.

Outra personalidade da música que decidiu fixar residência no bairro é o apresentador Léo Batista da Rede Globo.

Mas não só estrelas da música e da TV buscariam a tranquilidade de Jacarepaguá. Nomes da política nacional também. Décadas depois de Pedro Ernesto fixaria residência ali Pedro Ernesto, médico e prefeito do Rio por duas oportunidades (1931-1934; 1935-1936) tinha um sítio em Jacarepaguá, onde passou os últimos anos de sua vida.

João Goulart tinha um sítio, que se chamava Capim Melado, ao fim da estrada do Quitite. Passou bastante tempo com sua família nele, da década de 50 até o Golpe de 64, quando teve que se exilar no Uruguai. Nunca mais desfrutaria das delícias do sítio, já que nunca pode retornar ao Brasil, falecendo na Argentina em 1976.

O ar bucólico de Jacarepaguá lhe conferia uma tremenda áurea de discrição. O que favorecia outros intentos que não uma vida apenas sossegada. O que o diga Getúlio Vargas, que por diversas vezes procurou a região da Baixada, mais precisamente o Largo do Ó na Barra da Tijuca. Os encontros mais frequentes e tórridos, segundo alguns antigos moradores, teriam se dado com a vedete Virgínia Lane.

Outro que buscava refúgio no bairro, mas por outros motivos, bem menos prazerosos, era o líder comunista Luiz Carlos Prestes. A discrição do lugar foram providenciais em vários momentos, para onde se dirigia o Cavaleiro da Esperança, tentando se livrar das garras da polícia política, que o perseguiu por décadas por boa parte do século XX. O comunista e ateu Prestes se disfarçava, ironicamente, de padre quando aqui buscara guarida.

Terminamos destacando um casal de estrelas que por um tempo resolveu experimentar o que Jacarepaguá tinha de tão interessante: Garrincha e Elza Soares. Infelizmente, o Mané resolveu ir para o bairro quando já se encontrava em franca decadência, já tinha abandonado o futebol profissional e lutava (ou tentava lutar) contra o vício da bebida. Além da casa (comprada com o dinheiro de Elza), Garrincha chegou a montar uma escolinha no bairro, no campo cedido pelo Batalhão da Policia Militar de Jacarepaguá. Mas segundo relatos de amigos, Garrincha quase não comparecia ao local. Ele já começava a perder a batalha contra o álcool. E perderia também a casa de Jacarepaguá, perdida por dívidas.
Pior: perderia a Elza também.


Fonte: http://acervo.fpabramo.org.br/index.php/entrevista-com-mane-garrincha-em-sua-casa-ao-jornal-em-tempo-no-bairro-jacarepagua-rio-de-janeiro-rj-jun-1978-credito-autoria-desconhecida-em-tempo-2